07 nov Baixa cobertura vacinal alerta para volta de doenças já erradicadas
Por Blaranis Gomes e Lucas Ribeiro
Embora tenha um histórico exemplar no quesito vacinação, o Brasil tem vivido um declínio na taxa de pessoas imunizadas. O alerta para essa situação não é de hoje: em 2020, o país não atingiu nenhuma das metas de cobertura das vacinas infantis disponíveis pelo Programa Nacional de Imunização (PNI), segundo o Ministério da Saúde.
Em entrevista à Agência Nacional para matéria publicada em setembro deste ano, o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e pediatra, Juarez Cunha já fazia o alerta: “De forma geral, todas as coberturas vacinais estão baixas. Se, em 2019, elas já eram baixas, agora em 2022 ficaram mais baixas ainda. E o que isso significa? Todas as doenças chamadas imunopreveníveis e, em especial a população vulnerável, que são as crianças, estão desprotegidas. Estão vulneráveis a doenças que foram, muitas delas, eliminadas ou controladas. Com baixas coberturas vacinais, podem retornar e acometer as crianças e a nossa população”, afirmou.
Enquanto em 2015, a média de cobertura vacinal atingiu 97%, em 2020 o índice caiu para 77% – como mostra os relatórios de 2020 do Panorama do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) – chegando a 68% em 2021. É importante lembrar que, para garantir a imunidade coletiva, o ideal é que as taxas estejam sempre acima de 90%. Com isso, doenças já erradicadas no país, como o sarampo e a poliomielite, ressurgem, podem deixar sequelas e até causar a morte.
O relatório do IEPS, que é detalhado por tipos de vacina, mostra que a que protege contra o sarampo – além da caxumba e rubéola – a tríplice viral, registra números de cobertura insuficientes desde 2017. No ano anterior, a Organização Mundial de Saúde (OMS) conferiu ao Brasil o certificado de erradicação da doença, conquista que perdemos em 2019 quando 20.901 casos de sarampo foram registrados em território brasileiro. Altamente contagiosa, essa enfermidade provoca tosse, olhos inflamados, coriza, febre, dor de garganta e manchas vermelhas na pele, podendo causar pneumonia e inflamação no cérebro em casos mais agravados.
Em Uberlândia, os números também caíram. Com taxas de vacinação abaixo do ideal em pelo menos 10 doenças, segundo levantamento de 2021. A Secretaria Municipal de Saúde intensificou estratégias este ano para aumentar os números e garantir uma efetividade na prevenção da poliomielite, por exemplo.
A reportagem publicada em junho de 2022 pelo Correio de Uberlândia apresentava a gravidade do caso de baixa adesão à vacinação da poliomielite na cidade. Na época da publicação, a taxa registrada pelo PNI para a cobertura da vacinação era de apenas 28%, como mostra a tabela publicada pelo veículo na ocasião e que trazia dados do sistema de informação do PNI.
Nesta mesma reportagem, o professor doutor em Imunologia e Parasitologia Aplicadas, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Elias José de Oliveira, relembrou que o sarampo foi erradicado no Brasil graças à vacinação em massa. “O Brasil foi exemplo para o mundo entre as décadas de 70 e 90 na erradicação de doenças. Nossos índices de vacinação chegavam acima de 95% da população. Falar de rubéola, caxumba e principalmente do sarampo é falar de doenças que eram comuns há 60 anos”, disse o especialista, ressaltando sua preocupação.
Meta não atingida em 2023
Nesta semana, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) finalizou a Campanha de Vacinação contra a Poliomielite com 80% de cobertura do público-alvo, sendo o estado com melhor resultado na Região Sudeste. De acordo com divulgação feita pela SES, a Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Uberlândia alavancou os índices com 80% de vacinados no Triângulo Mineiro, destacando-se no estado. Já em nível nacional, a cobertura vacinal ainda não conseguiu alcançar sua meta.
A desinformação é um sério problema que a população da era digital enfrenta e que afeta a todos os âmbitos sociais, inclusive e principalmente, o âmbito da saúde, como já mencionado em artigo da Conexões. É nesse cenário que as ondas do movimento antivacina tomam poder e informações como “As doenças evitáveis por vacinas estão quase erradicadas em meu país” são disseminadas e causam danos à saúde pública. Essa informação, por exemplo, causa uma percepção enganosa dos pais de que não é mais necessário vacinar os filhos pelo fato das doenças terem desaparecido. No entanto, é preciso ressaltar que os agentes infecciosos que causam as enfermidades continuam a circular em algumas partes do mundo.
A poliomielite, por exemplo, é uma doença que assolou o Brasil por muitos anos, desde 1911, mas começou a ser eliminada em 1988, a partir de campanhas de vacinação mais intensas promovidas pelos governos de vários países. Em meados de 1994, a doença já era considerada erradicada, mas ainda hoje o vírus circula em países como a África do Sul e outros países, o que representa uma ameaça às crianças sob risco de contraírem a doença com o vírus trazido por um viajante, por exemplo.
A cobertura vacinal contra a doença baixou muito nos últimos anos com a disseminação de fake news sobre as vacinas e os seus riscos em potencial. De acordo com o Ministério da Saúde, até 02 de setembro de 2022, dados preliminares mostram que foram vacinados 3.761.546 milhões de crianças menores de cinco anos de idade para a poliomielite, com uma cobertura vacinal alcançada de 32,5 %.
No Brasil, doenças como o sarampo, a rubéola e a difteria são consideradas erradicadas devido à ampla vacinação no território. Embora bem conhecidas pela população mais velha, grande parte daqueles nascidos após os anos 1990, sequer conviveram com os sintomas dessas enfermidades e não sabem reconhecê-los. Você sabe qual o perigo de cada uma dessas?
Todas essas doenças apresentam formas letais ou que causam danos irreparáveis e só puderam estar fora do círculo social graças à vacinação. Outra doença muito grave e que volta a aparecer é a febre amarela, a qual teve várias campanhas de vacinação em todas as regiões brasileiras, mas cuja campanha foi prejudicada pelas fake news. A informação que mais circulou foi a de que a vacina era letal e muito perigosa e isso causou uma diminuição significativa na vacinação.
O MOVIMENTO ANTI-VACINA
Para além das notícias falsas, temos também o movimento antivacina que corrobora muito para a baixa na cobertura vacinal. Tal movimento, já discutido em artigo da Conexões, leva em conta diversos motivos para a insegurança em relação às vacinas, tais como:
- Questões filosóficas e religiosas
- Fatores políticos e socioculturais
- Medo de reações adversas
- Desconfiança na vacina e/ou no provedor de saúde
- Resolução de doenças através de receitas naturais
- Não vê uma necessidade para a vacina
Esse resistência à imunização não é recente no Brasil. Ela está presente desde a Revolta da Vacina, movimento popular que lutou contra a obrigatoriedade da vacinação contra a varíola, em 1904. Hoje, o movimento ganhou grande popularidade com a COVID-19, vírus sobre o qual parte da população hesitou em se imunizar devido à falta de confiança nas vacinas.
A amplificação dessa resistência causada em função da vacina contra COVID-19 pode ajudar a explicar o porquê das coberturas vacinais estarem tão abaixo do esperado. Além disso, indivíduos que apoiam essa onda anti-vacina disseminam pelas redes sociais receitas e outros métodos que podem colocar em cheque a validade das vacinas.
Porém, é importante ressaltar que os órgãos públicos de saúde advertem que o único método para continuar com o título de doenças erradicadas são as vacinas e que estas são seguras, com comprovações científicas.
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