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Câmara de Uberlândia aprova projeto que proíbe acesso de menores a eventos considerados imorais

No dia 3 de abril foi aprovado na Câmara Municipal de Uberlândia um Projeto de Lei (PL) de autoria do vereador Átila Carvalho (PP), que torna proibida a entrada de crianças e adolescentes em exposições culturais e espetáculos que contenham “nudismo, pornografia, zoofilia, conteúdo devasso, libidinoso, imoral ou imprópria para a faixa etária”. Caso seja sancionado pelo prefeito Odelmo Leão (PP), o PL proíbe o acesso das crianças e adolescentes, mesmo com a autorização dos pais, além de prever a inserção do conteúdo da lei em todas as plataformas de divulgação de eventos. Prevê, também, multa de R$ 100 a R$ 1000 para organizadores de eventos ou estabelecimentos que descumprirem as ordens, e caso haja reincidência, o estabelecimento pode ser interditado, ter a licença de funcionamento suspensa de 30 a 90 dias e, ainda, ter a  licença de funcionamento cassada.

Em publicação na página no Facebook, o vereador comemorou a aprovação do projeto que, segundo ele, é uma vitória de todas as famílias de Uberlândia. “Desde o primeiro dia do meu mandato tenho lutado pelas famílias, elaborando preposições que conservem acima de tudo a moral e os bons costumes da nossa sociedade”, disse ele.

Mas o projeto de lei apresentado em Uberlândia não é novo. Casos semelhantes foram apresentados em Petrolina, Criciúma, Cárceres e em Manaus, que apresenta texto idêntico ao do vereador Átila Carvalho. Os projetos  ganharam força após o burburinho que tomou as redes sociais em 2017 com a repercussão da performance de um artista nu, no Museu de Arte Moderna (MAM) em São Paulo, que influenciou no cancelamento da exposição Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira, no Cultural Bradesco, em Porto Alegre, por alegações de “blasfêmia e zoofilia”.

Nos casos citados, os estabelecimentos seguiam as recomendações do Ministério da Justiça e da Vara da Infância e da Juventude que torna obrigatório a sinalização do tipo de conteúdo apresentado, no caso do MAM, a nudez, deixando que pais e responsáveis, cientes do conteúdo, decidam por levar ou não seus filhos.

Já com o projeto de lei apresentado em Uberlândia, mesmo com a autorização dos pais, crianças e adolescentes não poderão frequentar os eventos classificados como “imorais”. A problemática, no entanto, perpassa também a subjetividade do que é considerado moral ou imoral, ou o que fere os bons costumes da família brasileira. Não há indicações de quem serão os responsáveis por tal classificação e a partir de quais preceitos serão consideradas. Para entender essas questões e saber mais sobre o projeto, a Conexões tentou contato com o Vereador Átila Carvalho, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Ana Paula Almeida (35) moradora da zona oeste de Uberlândia, é mãe de duas meninas, de 4 e 7 anos. Para ela, esse tipo de lei não é necessária, visto que bastaria a classificação indicativa, como já acontece em programas de televisão e cinema, pois, a decisão final cabe somente aos pais. Questionada sobre o que seria considerado imoral, Ana Paula diz que tudo depende das crenças e valores pessoais. “Por exemplo, pra mim, novelas da Globo, Big Brother Brasil e programa do Ratinho não são adequados para minhas filhas, mas elas assistem Largados e Pelados”, conta. Ou seja, para ela, a nudez por si só não é imoral.

Robisson Sete é editor e atua com a cena cultural de Uberlândia, promovendo eventos ligados à literatura, música e audiovisual.  Os eventos organizados por ele são abertos a todos os públicos e idades. “Participam jovens, adultos, idosos e famílias. Geralmente as crianças adoram e nós também, produção, artistas e público. Há casas de shows noturnas que proíbem a entrada de menores, então quando fazemos nesses locais, elas nem mesmo podem entrar, conforme o Estatuto da Criança e Adolescente já prevê”, explica Sete.

Para o editor, que é pai de uma criança de 4 anos, a arte e a cultura são educadoras e libertadoras e opina que “esse é um projeto de controle social, cerceador e, na verdade, visa atingir a classe artística ”.

Sobre a Classificação Indicativa

Em 2009, o Ministério da Justiça lançou a cartilha  “Classificação Indicativa – Informação e Liberdade de Escolha” na qual apresenta as categorias utilizadas para a classificação indicativa,  aplicadas em programas de televisão e cinemas. A classificação de eventos ao vivo, como shows e espetáculos, não cabe ao Ministério da Justiça, mas a cartilha de cunho educativo deixa claro que: “A classificação é um conjunto de informações dirigidas às famílias para que decidam sobre o acesso de seus filhos ao conteúdo que pretendem assistir. Ninguém melhor do que os pais para conhecer seus filhos. A classificação não substitui a decisão da família quanto ao acesso a entretenimento, informação ou cultura”.

O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente

No capítulo II Da Prevenção Especial, seção I do Estatuto da Crianças e do Adolescente fica posto no Art. 75 que “toda criança ou adolescente terá acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa etária” e “as crianças menores de dez anos somente poderão ingressar e permanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou responsáveis”.

Já no artigo Art. 76. fica posto que “as emissoras de rádio e televisão somente exibirão, no horário recomendado para o público infanto juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas” e que “nenhum espetáculo será apresentado ou anunciado sem aviso de sua classificação, antes de sua transmissão, apresentação ou exibição”.

Jhyenne Gomes
jhyennegomes@gmail.com
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