28 mar Can you understand me?
O professor de inglês chega na sala de aula com um radinho a pilha e, a cada lesson, os alunos escutam e repetem as palavras ou frases que são ditas, treinando a interpretação e a pronúncia. Essa é uma cena clássica – ou deveria ser – aos alunos que estudam inglês nas escolas do país.
As lessons se aliam às atividades que ajudam na fixação de palavras de forma leve e divertida. Esse é o caso da paródia de “Só quer vrau”, adaptada para o inglês pelos alunos do 2° ano do Ensino Médio do Instituto Federal do Amapá (IFAP), que estourou nas redes sociais em junho de 2018. Postado no YouTube, o vídeo chegou a cerca de 22.130 visualizações, sendo que oito mil foram alcançadas em menos de cinco dias. “Esse foi um aprendizado importante para pessoas que não tinham facilidade em inglês ou que não gostavam muito”, relata Enelly Camili de Brito, uma das criadoras da paródia, ao G1 Amapá.
O episódio chama a atenção para o panorama de ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras, especialmente a língua inglesa, no Brasil. O ensino de outras línguas está presente no nosso país desde 1837, quando o Colégio D. Pedro II passou a instruir os alunos em francês, inglês, alemão, italiano, grego e latim. Mas, 181 anos depois, ainda temos problemas estruturais que merecem ser discutidos.
Em 2018, o Brasil perdeu 12 posições no ranking do Índice de Proficiência em Inglês (IPE). O estudo é realizado anualmente pela EF Education First, empresa de educação internacional especializada em intercâmbio, e abrange todos os países do globo. Neste ano, o Brasil registrou a pontuação de 50,93; mantendo-se na categoria de proficiência “baixa”. Há seis anos – em 2012 – havia sido classificado enquanto “muito baixo”. Dentre os BRICs, está em pior nível, junto da China. Dentre os países latino-americanos, está dentro da média (50,33). E, dentre os países do globo, está abaixo da média.
A classificação “baixa” significa que os brasileiros têm capacidade de fazer turismo em um país de língua inglesa, envolver-se em conversas com colegas e ler mensagens simples. É bem diferente da realidade polonesa, classificada em proficiência “alta”, em que os cidadãos conseguem ler jornais, compreender programas de televisão e fazer apresentações de trabalho em inglês.
De toda forma, uma proficiência muito alta é o que garantem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que entendem o ensino de Língua Estrangeira como uma “ferramenta imprescindível no mundo moderno, com vistas à formação profissional, acadêmica ou pessoal”. Dentre as habilidades esperadas para um estudante do Ensino Médio, estão a representação, a comunicação, a investigação, a compreensão e a contextualização sociocultural.
No que tange ao legislativo, estamos bem. As Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBs) e os PCNs valorizam o ensino de línguas estrangeiras dentro e fora da escola. Entretanto, no momento de executar as leis, percebem-se problemas até então não explorados. Em 2017, por exemplo, o EPI percebeu que a proficiência em inglês está diretamente relacionada à renda nacional e à penetração da internet no país. Isso nos coloca cada vez mais distantes do que garante o poder legislativo.
Embora, em proporções mundiais, existam exceções que conseguiram ultrapassar as estimativas do IPE (como o Vietnã que, apesar de contar com apenas 53% da população digitalmente incluída, investiu o equivalente a R$ 1,5 bilhão para o ensino de inglês e driblou a falta de recursos e de infra-estrutura), sabemos que o Brasil conta também com baixos índices de renda e acesso à internet. E, também, que não está disposto a investir tanto dinheiro no ensino de inglês – a menos, é claro, que o presidente queira agradar um pouquinho mais o seu líder, Donald Trump.
Com baixas expectativas de execuções estatais, seguimos em nossa realidade de país emergente, mas não tão emergente assim. Para variar, contamos com parcerias público-privadas, privatizações e domínios empresariais. O exemplo mais recente é o da iniciativa promovida pela professora carioca Cláudia Bellizzi. Morando em Londres, ela contatou René Silva e Nathália Nascimento, vozes importantes no Complexo do Alemão, e criou um curso gratuito de inglês para moradores do local, de todas as idades.
A iniciativa é linda, mas é uma pena que não tenha sido promovida anteriormente por governos que têm esse dever. Por dificuldades estruturais que poderiam muito bem ser resolvidas por ações políticas, as empresas cumprem as obrigações do Estado e este se torna cada vez mais mínimo. Mínimo em promover direitos, mínimo em cumprir deveres. E a nossa estagnação prova estar muito além dos índices do EPI.
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