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Contornando as pedras no caminho

“Nada acontece por acaso, tudo que acontece na nossa vida é plano de Deus. Ele tem suas maneiras de trabalhar”, afirma deficiente visual.

 

No meio da manhã, fui até a Associação de Deficientes Visuais de Uberlândia – ADEVIUDI. Numa das salas, alguns alunos assistiam a uma aula. Pedi licença e entrei, falei com a professora, expliquei que queria conversar com algum dos seus alunos. Muito prestativa, ela disse: “Senhor Antônio tá mais adiantado na atividade, o senhor pode ir lá?”. Sem pensar duas vezes Antônio de Oliveira, de 51 anos, se levantou e me acompanhou.

 

Sentamos no salão da Associação e depois de algumas risadas começamos a conversar. Antônio perdeu a visão quando criança. “Eu tinha de cinco a seis anos. Meus dentes demoraram a nascer, meus pais me levaram ao médico. Lá, deram um remédio para ajudar os dentes a nascerem. Quando os dentes rasgaram, vieram com muita força e olho estufou”.

 

Por isso, senhor Antônio precisou retirar o olho. “Apenas há dois anos que eu consegui uma prótese”, disse. Questionado sobre o outro olho, ele aformou que teve glaucoma, e que utiliza colírios para controlar a doença. Apesar disso tudo, durante esse assunto, que normalmente levaria a um clima tenso, ele deu uma distraída com uma fala otimista: “Hoje eu tenho só quatro por certo, mas eu dou graças a Deus por esses quarto por cento, porque não sou dependente de ninguém”, a frase terminou acompanhada de um sorriso extremamente contagiante.

 

 Antônio voltou a estudar graças as aulas oferecidas pela ADEVIUDI. Foto: Ygor Rodrigues/Agência Conexões

 

 

Depois da tempestade, vem o arco-íris. Sem precisar de pergunta, senhor Antônio começa a falar dos estudos que a associação oferece. “Eu parei meus estudos quando criança, tinha que ajudar minha mãe a sustentar a casa. Tem 17 anos que sou sócio da associação e já tem três anos que voltei a estudar”. Com bastante entusiasmo, ele, que é também membro da diretoria da ADEVIUDI, afirma que ser alfabetizado mudou sua vida. “Me sinto muito satisfeito por essa sala de aula, a professora tem muita paciência conosco”, afirmou.

 

Senhor Antônio, com toda convicção, falou rindo que quer morrer com 150 anos e pretende ser um idoso participativo nas atividades cotidianas. “Eu espero, ainda antes de 150 anos, colocar o anel de formatura no meu dedo”, ele sonha em trabalhar como professor infantil.

 

Com quatro filhos e onze netos, ele hoje é afastado pelo INSS por conta da questão da visão. Trabalhava em um clube e a empresa resolveu afastá-lo para a segurança das crianças que frequentavam o local. Senhor Antônio entendeu a situação sem nenhuma mágoa e disse que, às vezes, visita o antigo ambiente de trabalho.

 

Ele conheceu a associação por indicação. Hoje, além de ser sócio e membro da diretoria, senhor Antônio auxilia no que precisar. “Ajudo na maneira que eu posso, fazendo serviço de banco, aqui se precisar a gente lava um chão, um banheiro, ajuda na cozinha”.  Para ele a ADEVIUDI é muito importante. Tanto que questiona o que seria dele sem ela.

 

O papo chega ao final. Questiono se para ele, Uberlândia tem preparo para lidar com pessoas com deficiências. Senhor Antônio não esperou eu finalizar a pergunta e respondeu com toda convicção que a cidade não tem preparo nenhum, que falta muito a fazer. Apesar dessa infeliz realidade, a entrevista não termina tristemente. Agradeço-o e ele lembra que pretende ser professor. Rebato dizendo: “quem sabe dos meus filhos?”.

 

Agência Conexões
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