
15 abr Dandara: resistência negra e feminista da vereadora mais votada de Uberlândia
As eleições de 2020 foram muito importantes para a luta das mulheres negras no Brasil, que representam 28% da população, mas ainda apenas 6% em toda a política brasileira. No Congresso Nacional, são apenas 2,36% desse grupo que, segundo o IBGE, forma o maior contingente populacional nacional. Em meio a essa falta de representatividade, Uberlândia teve nas suas eleições uma mulher negra em busca de um espaço na democracia representativa: a atual vereadora Dandara Tonantzin.
Foi na sua infância, debaixo das lonas do MST, que a vereadora Dandara Tonantzin iniciou sua vida política. Com os pais militantes do Movimento Sem Terra (MST), Dandara passava os seus finais de semana em reuniões de partido e de sindicato. Na adolescência a, até então, estudante de ensino médio foi incentivada por uma professora a refundar o grêmio da escola. E em um cenário de tensão política, ela se viu lutando contra o aumento da passagem, por melhorias das condições, por mais direitos e por mais futuro para a população uberlandense.
E, em meio a toda essa empolgação da juventude, Dandara ingressou no curso de Pedagogia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Logo se encontrou assumindo a presidência do Diretório Acadêmico e a coordenação geral do DCE Diretório Central dos Estudantes (DCE). Foi na sua gestão que os alunos conseguiram o transporte Intercampi — que liga os campi Santa Mônica, o Umuarama e o Educa — , conquistaram a ampliação do Restaurante Universitário e ativaram a moradia estudantil. E nesse momento de manifestações e de disputa de eleições, ela se sentiu convocada a construir outras lutas, decidiu se mobilizar como militante por causas sociais.

Apesar de todo o seu passado em busca dos direitos próprios e dos outros, foi em um dos momentos mais difíceis de sua vida que a vereadora se engajou em uma luta ancestral. Como é contado no primeiro episódio do seu Podcast no Spotify, O Colar de Contas de Dandara. Foi em uma festa de formatura, em 2017, que Dandara sofreu uma violência que a marcará pelo resto de sua vida política e pessoal, tendo seu turbante — que representa muito mais do que um acessório, é também um símbolo de resgate à identidade — arrancado por seis homens brancos.
Da violência, veio a denúncia. Com um post no Facebook intitulado “A nossa presença incomoda”, ela percebeu como a presença de mulheres negras incomodava quando se faziam presentes em espaços brancos e privilegiados. E o Palácio de Cristal, local onde ocorreu a festa de formatura, era um ambiente extremamente elitizado. Com a viralização da postagem, os relatos que vinham com ela eram tão cruéis quanto o que a própria Dandara havia sofrido. A partir disso, ela decidiu ir além e tentar fazer um boletim de ocorrência do crime de racismo. O delegado colocou como “agressão física” e, entre parênteses, “motivada pelo preconceito racial”, disse ainda que não via motivo para aquilo tudo. Indignada, a ativista entrou com um processo civil-criminal e depois de seis meses, o promotor decidiu por arquivamento, e ainda completou “o racismo está na sua alma”. Por conta da violência — não apenas no acontecimento em si, mas na negligência das autoridades —, Dandara percebeu que precisava continuar uma luta que não começou e, infelizmente, nem terminará, uma luta ancestral, por reparação, por direitos e por igualdade.
Engajando-se cada vez mais em movimentos sociais, o coletivo do qual ela fazia parte passou a considerar a hipótese de uma possível candidatura. Em 2019, ela aceitou fazer parte desse projeto, que não era sobre uma carreira ou um desejo individual, era sobre representar um projeto coletivo para toda uma população também negligenciada. Mas, para ganhar essa disputa, Dandara percebeu que o futuro estava nas redes sociais, já que aquele antigo formato de militância sindical, que originou as principais organizações de esquerda no mundo nas décadas de 70 e 80, já não existia mais. Ela sabia que deveria ir para as ruas entregar papel e discursar — com todos os cuidados devido à pandemia —, mas também entendia que a rede alimentava e impulsionava as ruas, e que as ruas mobilizavam a rede. Dentro desse mundo digital, a sua equipe fazia Tik Toks para defender o S.U.S. e Reels — a plataforma de vídeos dentro do Instagram — para se posicionar politicamente. A partir disso, surgiu a ideia do seu Mandato Digital e do “Dandata”, previsto para ser o maior banco de dados públicos do Brasil, afinal, Dandara acredita que informação é poder e que essa deve ser socializada. O mandato digital busca trazer o povo para dentro da Câmara, ao divulgar quando serão as sessões e quais as pautas que serão debatidas. Contando também com o posicionamento dos seguidores, sendo com enquetes nas redes ou até reuniões online abertas. E foi assim, com propostas visionárias e voltadas não apenas para o social, mas também para o digital, que Dandara, aos 27 anos, conseguiu se eleger, com 5.237 votos, sendo a vereadora mais votada de Uberlândia.
Agora, eleita, seus maiores desafios continuam sendo a busca de dignidade para o povo — com o pensamento em uma geração de renda básica eficaz — e dentro da Câmara, por ser uma mulher negra, jovem, professora na política e de oposição, e a única vereadora de oposição ao atual prefeito. Inspirada por Benedita da Silva, a primeira senadora negra do Brasil, Dandara segue seus passos ao ocupar ambientes frequentados principalmente por homens brancos e ao fazer de sua existência um ato de resistência
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