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Direitos à população LGBT? Quais?

“Violação do direito básico da pessoa”. É assim que Michelle Prado, enquanto LGBT, define o amparo que tem do Estado e da lei. Ela afirma que não se vê protegida pela legislação. Legislação essa que, especificamente para a população LGBT, não existe. No conjunto de leis não há aquelas que abarcam, de forma particular, as pessoas  LGBT.

 

Trâmites

 

Os parágrafos prescritos nas leis não ausentam a população LGBT dos seus direitos, mas também não os deixam evidentes. Desse modo, as decisões de aplicação dos direitos ficam a cargo dos juízes, que em sua totalidade não aceitam determinadas deliberações, como por exemplo,  a retificação do nome social e, principalmente, o nome civil.

 

Sobre esses trâmites e ausência de lei específica que regulamente os direitos do LGBT, Terezinha Tavarez, professora de Direito na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com mestrado relacionado ao assunto LGBT, explica que “o que existe são decisões de juízes, que vão se consolidando e abarcando alguns direitos”.

 

A professora desenvolve um projeto de extensão na UFU, vinculado ao Escritório de Assessoria Jurídica Popular (Esajup), que hoje funciona como atendimento jurídico gratuito à  comunidade LGBT. Sobre os atendimentos, Tavarez comenta que muitos deles são relacionados à retificação do nome e que em Uberlândia os recursos judiciais, hoje, têm uma aceitação maior quanto ao nome social. “Aqui os juízes têm permitido. Hoje em dia está mais tranquila essa aceitação diante os termos jurídicos”. Terezinha diz ainda que, do ponto de vista da segurança, a cidade apresenta falhas. “Muitas vezes a polícia não está preparada para lidar com  a questão do LGBT”, finaliza ela.

 

Nome social

 

O Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, discorre sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

 

“Art. 3o  Os registros dos sistemas de informação, de cadastros, de programas, de serviços, de fichas, de formulários, de prontuários e congêneres dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional deverão conter o campo “nome social” em destaque, acompanhado do nome civil, que será utilizado apenas para fins administrativos internos.”

 

No âmbito estadual, de acordo com informação veículada no no Portal Brasil (em 29 de abril de 2016), atualmente 18 estados e 12 munícipios têm decretos que permitem o uso do nome social por travestis e transexuais.

 

Minas Gerais está entre os estados adeptos ao decreto que autoriza a utilização do nome social. Em Uberlândia, o projeto de lei que reconhece o uso do nome social por pessoas transexuais e travestis foi aprovado na Câmara Municipal no dia 5 de maio deste ano. De acordo com Ylana Houston, assessora da vereadora Pâmela Volp, responsável pelo projeto de lei, este já foi sancionado e aguarda o período de três meses para entrar em vigor. Ylana comentou que, neste momento, as dificuldades continuam as mesmas e os resultados dependem do poder judiciário. “A gente ainda fica a dispor da boa vontade do judiciário, pois ainda não é uma lei, então passamos pelas mesmas coisas”, afirma a assessora.

 

Pâmela Volp e parte de sua bancada são integrantes da população LGBT. Assim, pautam as necessidades e direitos dessa população que são essenciais. Ylana comenta que essa é uma luta deles. “Não estamos lutando por uma coisa que é do outro. A gente vive isso”.

 

Novas propostas foram e estão sendo pensadas, mas ainda não podem ser divulgadas. “Nós não podemos divulgar, mas temos nossas bandeiras e projetos pensados não só para o público LGBT, mas para as mulheres negras, para as casas de matrizes africanas, as partes mais excluídas. Vamos lutar por eles”, pontua a assessora Ylana.

 

A equipe ainda está em seu primeiro mandato, fato que a leva a ser mais cautelosa nesse momento. “A gente sabe que precisa, mas ainda não sabe por onde começar. Estamos ainda conhecendo o terreno, para depois ver onde vamos buscar”, finaliza Ylana.

 

“Você tem que implorar pra manter seu nome social respeitado”, Michelle Prado | Foto: Laura Fernandes

 

Burocracias e desconforto

 

Os transexuais podem entrar com ação judicial para mudar seu nome civil ou seu sexo, porém o processo é longo e difícil . A demora e a dificuldade fazem com que o nome social seja uma facilidade temporária, até mudar o nome civil, uma vez que é necessária a comprovação do processo de mudança. Tais dificuldades foram vivenciadas por Michelle Prado até retificação de seu nome civil.

 

Michelle é transexual e sua adaptação com o nome social e, principalmente a retificação dele, apresentou um processo bastante burocrático. Em 2011, ela iniciou o processo de adaptação. Primeiramente mudou seu nome social. Seu primeiro documento oficial foi o Cartão do Sistema Único de Saúde. O segundo passo foi mudar seu nome nas redes sociais. Acompanhado a essa ação, Michelle iniciou seu processo de transxualização e acompanhamento com profissionais da área, além de psicólogos. Todos esses passos foram longos e graduais. A burocracia que o judiciário exige não permite agilidade e resolução imediata da retificação do nome. “Não são todos os juízes que entendem e chegam a falar ‘Já mudou agora, já quer mudar tudo’. Eles pedem provas de que você é você mesmo e eu fui juntando essas provas”, explica Michelle.

 

Desde 2015, seu nome civil já é Michelle Prado. | Foto: Laura Fernandes

 

Nesse período de junção das provas, Michelle conta que passou por momentos de desconforto devido ao fato do nome social não ser aceito em todos os espaços. “Saindo do local onde seu nome social não é respeitado, sua cidadania acaba”, frisa ela. Nos postos médicos chegou a ser chamada pelo seu nome civil. Em ambientes de trabalho o nome civil vinha acompanhado do nome social que, muitas vezes, não era utilizado. Alguns ambientes não aceitavam o nome social, o que a levou a passar por situações constrangedoras. Segundo Michelle, essa situações hoje a fazem refletir que “o nome social tem sua importância, melhor que nada, mas ainda não é o ideal”.

 

Ao longo de três anos, Michelle reuniu comprovantes, como ela mesmo diz, de que “eu sou eu mesma”. Foram reunidos: documentos constando seu, até então, nome social; fotos constando a mudança; além de certificados de cursos feitos ao longo desse tempo, também constando o uso do nome social. No final de 2014, ela procurou o apoio judiciário disponibilizado pelo atendimento junto à Esajup e entrou com o processo de retificação do nome. Michelle afirma que tinha muitas provas de sua mudança. Sendo assim, o procedimento, após a protocolação, demorou dois meses para ser julgado, o que para ela foi rápido. “Eu tive muita sorte de ser sorteada com uma juíza com uma mente mais aberta. Ela analisou rápido meu processo,, com base nos outros que ela já tinha avaliado e deu o parecer favorável”, explica Michelle.

 

Ela contou ainda que, naquele mesmo período que submeteu seu procedimento, uma amiga teve a sua solicitação negada. O juíz responsável pelo caso indeferiu o processo e este foi encaminhado para a segunda instância. Apenas após cerca de uma ano, segundo Michelle, sua amiga teve o processo aceito.

 

Quanto aos seus direitos, Michelle finaliza dizendo que não se sente amparada. “Eu vejo que, quando temos, nossos direitos são muito precários e em sua maioria são violados”, desabafa.

 

Pareceres

 

As resoluções, em sua maioria, igualam os direitos de homossexuais aos direitos de heterossexuais, como por exemplo: adoção e homofobia. “Hoje, o casamento homoafetivo é reconhecido judicialmente, mas a lei específica que os guarda não existe”, explica Maria Terezinha Tavarez.

 

Adoção

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente não menciona o gênero dos cônjuges adotantes, apenas traz que a adoção só pode ser disponibilizada caso sejam casados ou mantenham união estável. Ou seja, não há impedimentos legais à adoção por casais homossexuais, embora não haja também uma previsão legal explícita que autorize a adoção por um casal gay. Por conta disso, muitos juízes ainda negam o direito à adoção para homossexuais.

 

Artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente”Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)

 

§ 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)”

 

Homofobia

 

A lei não prescreve absolutamente nada. Crimes motivados por homofobia, diferentemente das ocorrências de agressão com negros e o racismo, são julgados iguais a qualquer outro delito no país.No ano passado, mais de 1,8 mil pessoas da população LGBT denunciaram a violação de direitos humanos por meio do Disque 100.

 

Casamento

 

De acordo com a Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013, “cartórios de todo o Brasil não poderão recusar a celebração de casamentos civis de casais do mesmo sexo ou deixar de converter em casamento a união estável homoafetiva. Caso algum cartório não cumpra a Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o casal interessado poderá levar o caso ao conhecimento do juiz corregedor competente para que ele determine o cumprimento da medida. Além disso, poderá ser aberto processo administrativo contra a autoridade que se negar a celebrar ou converter a união estável homoafetiva em casamento”.

 

 

 

 

 

 

 

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