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Governo sem senso corta o censo

O Censo é a única pesquisa a visitar as casas de todos os brasileiros – são cerca de 60 milhões de residências, espalhadas por 5.570 municípios e 8,5 milhões de quilômetros quadrados, envolvendo uma equipe de mais de 230 mil pessoas. O Censo traz não apenas o tamanho da população brasileira, mas informações sobre alfabetização, educação básica e ensino superior, saneamento básico, renda, natalidade e mortalidade, condições de moradia, coleta de lixo e fornecimento de energia elétrica, entre outros. O Censo difere-se da pesquisa amostral, pois esta investiga apenas uma parte da população e, a partir de modelos matemáticos, chega a dados que representam – estatisticamente – o todo.

A pesquisa é realizada no Brasil a cada 10 anos, desde seu surgimento em 1872, e deveria ter sido feita em 2020, mas havia sido adiada para 2021 devido a pandemia da covid-19. Contudo, o censo que ocorreria em 2021 também foi cancelado. Em abril, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo Censo, que neste ano completa 85 anos, já havia suspendido as provas do processo seletivo para recenseadores e agentes censitários, devido ao corte de 96% já previstos no orçamento.  A realização de todos os censos no Brasil desde o seu surgimento é um marco, de modo que é um importante medidor para entender a realidade do país, além de termômetro para criação de políticas públicas. 

O Censo já era alvo de discussões em debates orçamentários mesmo antes da pandemia, em 2019. Quando o ministro da Economia, Paulo Guedes, queixou-se dos seus altos custos, na época, estimados em R$2,7 bilhões, e também alegou exagero no número de questões. Na ocasião, Guedes mentiu ao afirmar que a pesquisa possuía 360 perguntas, quando na verdade são aproximadamente 150. E é justamente por ser uma pesquisa tão profunda, que exige essa quantidade de recursos, que ocorre só a cada dez anos.

A última pesquisa ocorreu no ano de 2010, quando o Brasil passava por um outro momento, econômica e politicamente. Vivemos hoje um processo de aumento das desigualdades, empobrecimento da população, retorno ao mapa da fome, além de uma pandemia, que provoca mortes e desfalques em diversos segmentos da população.

Os censos populacionais são comuns nos mais diferentes países, porque são essenciais para direcionar políticas de Estados. Com o cancelamento do censo, ficamos sem conseguir avaliar o cenário a partir de 2010, além do apagão que impede a organização do Estado para criar políticas sociais e econômicas.  A falta do censo pode gerar uma perda de eficiência das políticas públicas, desde o auxílio emergencial até a própria própria vacinação, além das políticas não atreladas à pandemia, como Bolsa Família, políticas de emprego, sondagem de onde há necessidade de hospitais e escolas. O censo é um importante termômetro para a alocação de recursos e, sem ele, a perda de dinheiro devido a falta de eficiência tende a ser maior.

Em uma época em que a ciência é desvalorizada, o negacionismo ganha cada vez espaço e as Fake News se propagam, os dados como os oferecidos pelo Censo são uma importante arma contra a desinformação. O cancelamento do Censo beneficia um Governo que tenta a todo custo negar a realidade enganando a população, mesmo que a partir de dados inventados e argumentos infundados. O planejamento, inclusive econômico, deveria ser baseado em dados, previsões e avaliações, é absurdo que um ministro que deveria usar esses dados para gerir melhor o estado, retire recursos e apoie o cancelamento dele.

Beatriz Nascimento
Beatriz.Nascimento@ufu.br
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