
24 jan Kainã Bragiola: O retrato de um artista completo

por Lucas Ribeiro
O multiartista Kainã Bragiola lançou seu primeiro álbum em julho de 2022. Um show intimista no Teatro Municipal com canções, poesias e reflexões pessoais marcou a estreia do projeto, que contou com incentivo do Programa Municipal de Incentivo à Cultura, o PMIC.
A Conexões acompanhou a apresentação e conversou com Kainã sobre o processo de lançamento do álbum, sua vida artística e inspirações. Discutimos também a importância das políticas públicas voltadas à cultura e aproveitamos para saber sobre o encaminhamento para o seu segundo disco. Confira!
Conexões: Como você se descobriu artista?
Kainã Bragiola: Eu acho que comecei a ter esses estímulos artísticos desde da infância. Meu primeiro contato com arte, não como fazer artístico, mas como uma brincadeira, foi o desenho. Depois, comecei a participar de alguns projetos sociais e um deles tinha o estímulo para o teatro, para a dança e tudo mais. Eu nasci em Jaboticabal, interior de São Paulo, e depois de um tempo, comecei a estudar desenho na escola de artes da cidade. Desenvolvi uma grande amizade, a gente fazia muitas coisas relacionadas a desenho, a música, já que ele tocava violão. Foi aí que comecei a cantar e a tocar mais, nessa época.
Conexões: No show, seu ex-chefe comentou que você deixou o estágio para se dedicar a música. Você pode nos contar essa história?
K.B: Eu fui para Uberlândia estudar Artes Visuais e consegui fazer estágio na Dicult, a Diretoria de Cultura da UFU. O diretor era o Lu de Laurentiz e, em um certo momento, ele me pediu para renovar o contrato e eu falei que não queria, porque ia me dedicar mais à música. Isso veio por conta das influências ali, das outras pessoas. A universidade faz com que você conviva com diversos tipos de linguagem e eu estava mais voltado para a música, fazia parte da trilha sonora de teatro, como compositor e também com apresentações em bares e eventos. Foi aí que decidi deixar [o estágio].
Conexões: Você lançou seu disco pelo Programa Municipal de Incentivo à Cultura, o PMIC. Como você soube da possibilidade de participar e como foi sua experiência?
K.B: A minha primeira experiência foi, acho que em 2013 ou 2014, quando descobri as ações de políticas públicas voltadas para a cultura, em específico o PMIC. Me inscrevi tentando lançar um álbum, e nessa época não fui contemplado. Depois de um tempo, entrei para o grupo Encantar, onde a maioria das ações do ano são captadas por leis de incentivo, seja o PMIC, seja no âmbito estadual ou nacional. Aí comecei a me atentar a isso, que era uma possibilidade de fazer com que os meus projetos saíssem na gaveta. Comecei a estudar algumas coisas sobre projetos e também tive auxílio de outros profissionais para escrever o projeto e lidar com as burocracias.
Conexões: Como é, para você, ser artista no Brasil? Como seguir com a arte diante das dificuldades e do desrespeito ao setor cultural brasileiro?
K.B: É bem difícil porque, ainda por cima, a gente está num lugar que não é um polo do mercado musical. Então, a gente não tem cachês altos, gravadoras e tudo mais. Eu sei que isso já está mudando, mas é bem complicado. Se não fossem essas leis de incentivo ainda seria pior. É difícil ser músico, artista, você tem que ter muito amor mesmo e acreditar nisso porque, diversas vezes, você vai pensar em desistir e arrumar um emprego com carteira assinada.
Conexões: Você é um artista independente. O que é o melhor e o que não é tão bom nisso?
K.B: Não sei como seria não ser artista independente, então, só sei o que eu experiencio. Desde sempre fui um artista independente, não faço ideia de como é ter um contrato com uma gravadora, ou ter o auxílio de um selo [de gravadora] e tudo mais. Você tem que fazer as suas conexões, tem que buscar parceiros que também estão nessa mesma empreitada, aumentar o espectro da comunidade de sentidos, ver quem está alinhado e se alinhar também a outros artistas. Tem a ver com parcerias. E quando essas parcerias também não acontecem, é um lugar muito solitário.
Conexões: Como foi a experiência de se apresentar no Teatro Municipal de Uberlândia?
K.B: Foi uma Glória, um negócio maravilhoso. A apresentação estava inserida dentro do programa [do PMIC] no meu projeto. Até chegar lá foi um processo, uma jornada, mas foi incrível. O dia em si passa muito rápido. A apresentação, então, parece que você piscou, acabou. Mas eu vejo como uma vitória a gente conseguir, dentro de um projeto independente ter sete músicos no palco, quatro convidados, um apresentador, alguém tratando da luz, outra pessoa cuidando do figurino. E, no boca a boca e através de alguns profissionais do marketing, consegui colocar um tanto significativo de gente ali. Porque não adianta você fazer uma coisa e ninguém assistir. Foi uma Glória, um dia que eu guardo com carinho.
Conexões: Como você definiria sua música?
K.B: Eu sou um músico curioso, autodidata por ignorância própria. Eu tenho uma vontade enorme de ficar experienciando, experimentando. E, como a música é algo inesgotável, acho que isso que me fisgou: diversas possibilidades. A possibilidade de ser instrumentista, possibilidade de escrever arranjo, de criar letras, inventar mundos sonoros. Isso que me encanta. Então, me defino como um curioso.
Conexões: O disco Retrato de um Artista Quando Isolado foi lançado durante a Pandemia. O título do álbum e a faixa Saudades deixam escapar uma menção ao período difícil que o mundo enfrentou. Como esse momento influenciou na sua música?
K.B: Foi um álbum pandêmico e, no final das contas, aliás, no início das contas, se tornou o mote para o álbum. Algumas composições eu peguei da minha trajetória mais antiga e, em outras, criei mesmo durante a pandemia. E, especificamente a música Saudades é daquele amigo que eu comentei no início da entrevista, que é o Matheus Bruno Neves. Eu inseri duas canções dele, a outra é Estrela do Átomo, e uma também em parceria, que é Notas para a Nigéria. Além de outros parceiros, como eu disse, sobre as conexões, acabei convidando algumas pessoas para fazer parte do álbum. Uma das minhas habilidades como compositor é musicar poemas. Tem poema musicado do Enzo Banzo, tem duas faixas com poemas da poetisa Melise. Da pré-produção até o meio da produção foi feito isolado mesmo e não foi tão bom não, viu? Tava difícil pra todo mundo. Mas é dentro também das tristezas, das dificuldades, [que] a potência criativa pode vir. E ainda bem que esse edital emergencial foi aprovado, né? Porque contemplou tanta gente necessitada. Eu era um deles.
Conexões: Você também é artista visual. Suas canções trazem descrições visuais muito bonitas, além de poéticas. Acredita que é um exercício seu fundir sua atuação nas artes visuais com a música?
K.B: Acredito. Acho que é uma simbiose, uma coisa surge da outra e puxa a outra. Existe mesmo essa relação de trazer elementos visuais para música, dentro da minha produção visual também tem elementos musicais. Acho que é o tipo de coisa que me identifiquei, como se fosse uma marca poética. Com certeza é. Tem canções que nasceram de observação de pintura, de escultura. Angelina, B Root, aquela canção que tem no álbum [se referindo à faixa B Root’s, Alejandra, Richard e Angelina], ela saiu de uns desenhos que eu fiz. A própria Balada Azul [outra faixa presente no disco] “Azuis garatujas” é uma situação de um esboço e, assim por diante, uma alimentação mútua.
Conexões: Quais seus próximos projetos? O segundo disco já está chegando?
K.B: Canções tenho, ideias também. Mas eu gostaria de trabalhar mais com esse álbum agora em 2023. Mas já comecei a fazer outras coisas. Não sei se pode ser um álbum, mas já tenho um mote, uma ideia, mas eu pretendo lançar singles agora, que é ideia do momento, né? E alguns clipes mais simples das canções do álbum Retrato de um Artista Quando Isolado.
O álbum de Kainã está disponível nas plataformas digitais como Spotify e YouTube e você pode ouvir clicando aqui. Vale a pena conferir!
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