
22 ago Nova história, antigos problemas: Conheça mais sobre o SUS da Segurança Pública
No dia 12 de julho deste ano, quinta-feira, entrou em vigor o Sistema Único da Segurança Pública (SUSP) em todo o país, que, em meio a constantes discussões sobre o aumento da criminalidade e a intervenção federal no Rio de Janeiro, propôs a unificação das instâncias policiais e dos sistemas de segurança em todos conselhos públicos de defesa social. Para quem está por fora, o SUSP será o equivalente do Sistema Único de Saúde (SUS) na segurança pública, e procurará integrar ações e dados de todos os órgãos públicos do país, a nível federal, estadual e municipal.
A história não é nada nova, surgiu ainda em 2003, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quando foram apresentadas por especialistas governamentais ideias iniciais de se criar uma integração do sistema público de segurança em uma única administração. Sem muita discussão, a ideia foi deixada de lado durante nove anos.
Em 2012, durante o governo da presidenta Dilma Rousseff (PT), o projeto de lei de número 3.734 foi proposto pelo Poder Executivo procurando disciplinar a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública brasileira, alterando o artigo 144 da Constituição Federal, assim, dizendo-se dispor de uma segurança cidadã e respeitando os direitos humanos.
O documento surgiu em discussões da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados e sofreu lentas tramitações durante cinco anos, quando no segundo semestre de 2017, por fim, foi congelado. Entretanto, após a criação do Ministério Extraordinário e o decreto de intervenção federal no Rio de Janeiro, o projeto de lei retornou as mesas parlamentares e, em abril de 2018, foi aprovado com urgência na Câmara, em maio no Senado e em junho recebeu a sanção do presidente Michel Temer (MDB), começando a valer 30 dias após sua publicação.
Será responsável pela implementação e coordenação do projeto o ministro Raul Jungmann, titular do Ministério da Segurança Pública, repartição do governo que surgiu, inicialmente, em caráter excepcional, mas que foi transformado em pasta permanente. A traçagem dos órgãos que comporão o programa já foi feita e divulgada.
Na instância federal, estarão reunidas as Polícias Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal, a Guarda Portuária e as Secretarias Nacionais de Segurança Pública, de Proteção e Defesa Civil e de Políticas sobre Drogas. Nas instâncias estaduais, as Polícias Civis e Militares, os Corpos de Bombeiros, os Institutos de Criminalística, Medicina Legal e Identificação, os órgãos do Sistema Penitenciário e Socioeducativo e as Secretarias Estaduais de Segurança Pública. Nas instâncias municipais, as Guardas Municipais e os Agentes de Trânsito.
A principal motivação que culminou na criação do SUSP foi uma nomeada necessidade de compartilhamento de dados e informações sobre criminalidade, armamento, mortes e forças públicas. Tais necessidades levaram também a criação do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais, de Rastreabilidade de Armas e Munições, de Material Genético, de Digitais e de Drogas (Sinesp), um equivalente ao Datasus da saúde pública do país.
O Sinesp também será implementado pelo Ministério da Segurança Pública, o qual será responsável pela manutenção, cobrança de envio e atualização dos dados pelos órgãos componentes, sob pena de não receberem repasses de recursos. O banco contemplará reunir ocorrências policiais, dados da segurança pública, da defesa social, do sistema prisional e execução penal, de perfil genético e digitais, sobre o tráfico de drogas ilícitas e o rastreamento de armas e munições.
Outra importante etapa que envolve a instauração do projeto é a publicação do Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, documento em fase de elaboração e que trará objetivos, metas, ações, estratégias, prioridades e indicadores de formas de financiamento de políticas públicas para a segurança no país. Após a publicação do Plano, os estados e municípios têm o prazo de dois anos para convocar conselhos, elaborar e implementar seus textos correspondentes, sob pena de não receberem repasse de recursos. O Plano terá validade de dez anos após sua publicação.
Curiosamente, até a data de sanção do projeto de lei por Temer, o Ministério da Segurança Pública não sabia responder como o projeto seria financiado. A única nota divulgada era de que aguardavam a publicação de novas verbas para a segurança. Mesmo com esse cenário, somado à incerteza de quanto tempo duraria a implementação de um Ministério Extraordinário responsável pela administração da segurança pública, o projeto foi aprovado em menos de quatro meses depois de seu retorno aos parlamentares e rapidamente ganhou fãs, como os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que defenderam crucialmente sua aprovação, claramente na busca de visibilidade em ano eleitoral.
Em junho deste ano, o governo publicou uma medida provisória que deslocava verbas destinadas à cultura, esporte e educação provenientes das loterias federais e transferia para a segurança. Decisão duramente criticada, o Palácio do Planalto revogou a medida e divulgou que revisará o texto de origem de recursos para o Susp. Sendo assim, o programa segue sem financiamento definido.
Para entender melhor o “cumprimento” dos orçamentos para a segurança pública brasileira, de acordo com o Portal da Transparência do Governo Federal e o Relatório de Conjuntura Custos Econômicos da Criminalidade no Brasil, em 2014, a despesa prevista no orçamento do Fundo Nacional de Segurança Pública era de R$ 926,63 milhões, mas o gasto foi de apenas R$ 185,17 milhões. Até julho de 2018, de um orçamento de R$ 944,66 milhões, apenas R$ 82,45 milhões foram gastos.
Ainda nestas mesmas fontes de dados, é possível destacar que apenas 4,38% do PIB brasileiro de 2015 foi destinado à segurança, entretanto, o dado para a segurança pública é ainda menor, apenas 1,4%, e o encarceramento 0,3%.
Entendemos que a segurança pública brasileira não está nem perto de receber título de referência – vide exemplo a “necessidade” da instauração de uma intervenção federal -, mas o investimento que deveria ser destinado a essa esfera quase não compreende 30% do que é orçado. Assim, o que mais gera falta de credibilidade neste projeto está longe de ser a proposta de unificação da segurança – o que, na realidade, é muito bem visto por especialistas governamentais -, mas sim no histórico dos gastos destinados à segurança pública nunca “atingirem” o orçado.
Por que tirar da cultura, do esporte e da educação, quando se tem de sobra para a segurança? Isso é um questionamento para se levar em conta se repararmos que a segurança, “na teoria”, nunca se teve gastos tão altos. Seria essa urgência de instauração do projeto mais uma estratégia de desvio de financiamentos, uma propaganda eleitoral adiantada para limpar o histórico de desleixo com a segurança, ou uma real preocupação com nossas instâncias públicas de defesa social? Será que estamos seguindo e questionando os pontos certos ou só preocupados em midiatizar a “preocupação” do governo com nossas vidas? Afinal, de segurança, só quem sabe é polícia, correto?
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