29 ago Por que a Aids ainda é uma epidemia?
A meta da ONU para 2020 é uma taxa de detecção do HIV de no máximo 500 mil pessoas mundialmente. | Foto: Agência Marsala
A Organização das Nações Unidas (ONU) espera que até 2030 a epidemia da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids) seja controlada mundialmente. O que significa que sim, o HIV, vírus da imunodeficiência adquirida, ainda é um problema. Uma epidemia é caracterizada pela rápida infecção de determinada população ou ainda por infectar pessoas em determinada região de forma violenta com um surto rápido. Descoberta na década de 1980, a Aids não pode ser mais considerada de surto rápido. Mas o que torna essa síndrome epidêmica nas terras brasileiras se somos um país referência em seu tratamento?
Em primeiro lugar, para se dimensionar a questão da Aids é necessário entender como ela tem avançado mais recentemente. A ONU estima que, mundialmente, cerca de 1,9 milhões de pessoas se tornem soropositivas a cada ano, além disso, são mais de 1 milhão de mortes decorrentes de complicações relacionadas à Aids. No Brasil, foram diagnosticados cerca de 55 mil casos em 2014 e 2015. E em 2016 cerca de 48 mil.
Os números brasileiros parecem promissores, no entanto quando consideramos certas populações observamos que entre os mais jovens a taxa de detecção não só aumentou nos últimos anos, como apresenta novas particularidades. Ao pensarmos sobre o HIV entre os jovens, é possível perceber que na faixa etária entre 15 e 19 a taxa de detecção triplicou passando de 2,4 para 6,9 casos por 100 mil habitantes nos últimos anos. E entre quem tem 20 a 24 anos essa taxa saiu de 15,9 para 33,1 casos por 100 mil habitantes. Além disso, na faixa etária de até 14 anos o HIV agora tem face feminina, já que o número de casos entre meninas ultrapassa o de meninos na mesma idade desde 2010.
Grande parte do problema brasileiro se dá pela disparidade entre as regiões brasileiras. Por exemplo, enquanto o sudeste apresenta desde 2007 uma ligeira queda nos números de detecção do HIV entre a população a cada ano, regiões como o Centro Oeste e o Nordeste, que mesmo com o número bruto de casos e taxas menores, vêm aumentando sua detecção a cada ano. O Norte com a tendência clara de aumento começa a acompanhar o Sul, região em que mais se encontra a Aids em cada 100 mil habitantes.
E essa disparidade não é só numérica, ela é cultural. A discriminação e a culpabilização da pessoa que convive com HIV ou Aids é um dos grandes problemas ao enfrentar a síndrome, pois deixa-se seu caráter médico de lado e veste-se uma roupagem social. Roupagem esta que é resultante do imaginário dos anos 1980-90, nos quais se instituiu uma espécie de associação da Aids aos vulgares e às pessoas sobre as quais a punição divina estava caindo. Tal discriminação torna-se um impedidor para que a população procure tratamento médico.
Além disso, a população mais jovem, que começa a vida sexual cada vez mais cedo, é paradoxal. Embora tenham uma maior capacidade de acesso ao conhecimento, principalmente após a revolução digital e os anos 2000, os jovens são também relapsos na prevenção da própria saúde e encaram a Aids como uma doença distante e sem o peso da morte.
Mesmo que no Brasil a população vivendo com HIV e Aids tenha uma série de direitos e ações governamentais, visando garantir sua cidadania plena (entre os principais o acesso à terapia antirretroviral (TARV) e leis antidiscriminação em âmbitos federais, estaduais e municipais), o país derrapa em campanhas que não incentivam o diálogo e que são sazonais, aparecendo apenas no carnaval e no dia mundial de luta contra a Aids, comemorado em primeiro de dezembro. Também não somos capazes de superar a barreira de gerações e abrir um diálogo direto e esclarecido com os jovens brasileiros.
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