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Programa “Criança Feliz” é a confirmação do papel decorativo da primeira-dama

 

 

Marcela Temer discursa no Palácio do Plantalto. Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil

 

 

 

 

Na semana passada, Marcela Temer – esposa do atual presidente Michel Temer – tornou-se oficialmente embaixadora do programa social Criança Feliz. Em seu primeiro discurso, Marcela usou um tom emotivo e pausado na leitura de um texto sobre a importância dos cuidados (sobretudo das mães) com os “pequenos”, para que eles cresçam saudáveis e felizes. Talvez para ilustrar a imagem que o governo quer passar sobre Marcela: maternal, delicada e envolvida com os temas sociais. É a volta do primeiro-damismo clássico no Brasil.

 

O Criança Feliz é uma iniciativa do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário e tem como foco atender os filhos de beneficiários do programa Bolsa-Família durante a primeira infância. A ideia é capacitar profissionais da educação e da saúde para que eles façam visitas semanais às famílias que tenham crianças de 0 a 3 anos. As equipes do programa terão um visitador, um supervisor e um multiplicador, responsável pela capacitação dos visitadores e supervisores. Os dois primeiros serão servidores das prefeituras e o terceiro, do estado. A adesão ao Criança Feliz pelos estados e municípios é voluntária. O projeto conta com um orçamento de R$ 300 milhões para 2017 e tem a previsão de atender 600 mil crianças.

 

À primeira vista, tudo isso parece muito bonito e um projeto interessante. E de fato, pode até ser. Entretanto, ao ser lançado de supetão e através do apadrinhamento da primeira-dama, o projeto ganha ares de uma tentativa de sanar as críticas em relação à falta de investimentos em políticas sociais no governo Temer. Atrelar esta nova iniciativa ao Bolsa Família então, programa social mais famoso do país, se assemelha a desespero.

 

O zelo com as crianças é fundamental para que elas cresçam bem, mas para que isso ocorra, é preciso investir em políticas pensadas e executadas por profissionais (educadores, assistentes sociais, médicos e cientistas sociais) e não através da imagem benevolente e voluntária da primeira-dama. Além disso, ao falar dos cuidados que um filho necessita desde a gestação, Marcela se esquece (ou prefere não lembrar) das inúmeras particularidades acerca da maternidade para as mulheres mais pobres. Dificuldade de atendimento no SUS e, em muitos casos, violência obstétrica pelo mesmo sistema, falta de vagas em creches, a demissão que chega assim que a mulher volta da licença maternidade e o fato de a mãe carregar uma família inteira nas costas porque o pai dos filhos os abandonou são alguns pontos que precisam ser vistos como empecilhos para início de uma boa infância, e não apenas a “falta de cuidados”.

 

Em seu discurso, Marcela ainda afirmou que “cuidados na primeira infância ajudam a inibir comportamentos agressivos e violentos em adolescentes”. Os cuidados e o carinho da família certamente ajudam, Marcela, mas uma saúde pública decente também. E uma escola de qualidade, com professores bem remunerados e que estimulem o aprendizado e a criatividade das crianças mais ainda. Igualdade de oportunidades e um lar minimamente estruturado com certeza é o que garante a inibição da violência citada pela esposa de Temer. Seria interessante se Marcela se impusesse e fizesse diferente de outras primeiras-damas. Mas até o momento, é como se ela fosse uma bela decoração, lembrando a todo instante o principal papel das mulheres na visão do atual governo: secundário e preocupado com as questões do lar.

 

 

 

 

 

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