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Uberlândia está condenada a ter vias esburacadas todo verão?

Cada vez que chega o verão no Cerrado chega a chuva e, com ela, os buracos por toda cidade. As chuvas não dão trégua. A Secretaria Municipal de Obras afirma que o período chuvoso impede a execução de tapa-buracos, serviço responsável pela reparação do asfalto. Já o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) diz que os buracos abertos durante esse período são reparados constantemente. E a pergunta que fica é: será que a abordagem adotada para o problema é realmente eficaz?

Os exemplos são infindáveis. Gabriel Azambuja, morador do bairro Pacaembu, afirma que os buracos sempre existiram pela região onde mora, mas com as últimas chuvas, só ampliaram. “Não sei quais buracos são tapados constantemente, porque os daqui do bairro só aumentaram e parece que todo dia tem um novo, somos sempre pegos de surpresa. Ainda mais a noite, no escuro. Já tive um pneu estragado por um buraco enorme aqui perto de casa, foi um ‘baita’ prejuízo”, declara.

Em outro ponto da cidade, parte da Avenida Professora Minervina Candida Oliveira está totalmente sem asfalto desde o final de 2021, causando muita dificuldade para os carros que precisam passar por esse trecho.  Até o momento a via segue sem qualquer tipo de reparo, apenas terra e, quando chove, muita lama.

A rua Rua Joaquim Carrijo Netto, localizada no bairro Tocantins, está com um buraco que ocupa metade de sua extensão. Segundo moradores, essa “cratera”, como denominaram, está por lá há pelo menos duas semanas. 

“Esse buraco enorme, começou ano passado, bem pequeno, como ninguém veio aqui arrumar, quanto mais chuva, mais ele aumentava, até que chegou a esse tamanho”, relata Luísa Zuchetti, moradora do bairro.

A administração municipal oscila entre culpar as condições climáticas “excepcionais” e distribuir a responsabilidade pela recuperação das vias. O prefeito Odelmo Leão, por exemplo, quando questionado sobre a avenida sem asfalto durante uma coletiva de imprensa, respondeu que, por não se tratar de território municipal, ele “não pode interferir”. Disse também que cobrou o Dnit há dez dias, mas não obteve retorno.

Buraco na rua rua Joaquim Carrijo Netto, bairro Tocantins / Foto: Laura Fontoura

Após a forte chuva do dia 16/01, a Avenida Rondon Pacheco, já conhecida por seu histórico de alagamento voltou a sofrer estragos e ficou interditada por alguns dias para reparos. Mais uma vez, o prefeito Odelmo Leão comentou que, segundo meteorologistas, choveu cerca de 73 milímetros em apenas 20 minutos, um número expressivo e além do esperado.

Asfalto retirado pela enxurrada na Avenida Rondon Pacheco / Foto: PM/Divulgação

As cenas de destruição de 2022 não são inéditas e nem recentes. O professor Edson Pistori em artigo recente lembra que, desde a construção, a Avenida Rondon Pacheco sofre as consequências de um erro técnico do projeto que pavimentou a via sob a canalização de três córregos, São Pedro Lagoinha e Jataí. Muito dinheiro público e até vidas se perderam em função dessa falha, mas verão após verão, não se discute o problema. Como resume perfeitamente Pistori, o que cada administração faz é “recolher o entulho e refazer o asfalto até que a próxima chuva o destrua novamente”. Então, perguntamos novamente: essa é a melhor forma de “resolver” o problema?

Buracos causados pela chuva não acontecem só em Uberlândia, cidades pelo Brasil todo também enfrentam esse problema. Uma explicação para tantos estragos, segundo o especialista Ronderson Queiroz Hilário, professor do departamento de Engenharia de Transporte e Geotecnia da UFMG, em entrevista dada para a Revista Encontro, é que o dimensionamento do asfalto pode não mais servir para o número de veículos atual da cidade. As operações de “tapa buraco”, podem não ser tão eficazes se a pavimentação de determinada via não for condizente com a carga de tráfego. 

Quando pensamos em asfalto de qualidade, a Alemanha é um modelo a ser seguido. O país europeu tem pistas que parecem “tapetes”, as chamadas ‘autobahns’. A Autobahn é um conjunto de estradas que atravessa o país de ponta a ponta, somando cerca de 12.800 km, conta com uma camada de asfalto que varia de  55 a 85 cm de profundidade, o que permitiria a aterrissagem de um Boeing 747 sem que a estrada sofresse qualquer dano. A extrema qualidade dessas estradas já serve de modelo para o mundo todo, inclusive, foi usada a técnica de pavimento alemã aqui no Brasil, na cidade de Macapá. 

Em entrevista dada ao rádio local LuizMeloEntrevista (Diário 90,9FM), no ano de 2020, quando a pavimentação estava sendo feita, o arquiteto David Covre, coordenador do Plano de Obras do Município de Macapá, disse que se trata de uma pavimentação com ‘geogrelha’, que é aplicado abaixo da capa asfáltica como reforço do pavimento para estruturá-lo. “Tecnicamente falando, ele equivale a 12 centímetros de brita graduada, então ele reforça o pavimento dando a ele maior durabilidade”, explica. Essa técnica faz o chamado ‘rebatimento de trincas’, que vem de baixo para cima e, assim, não chegam ao pavimento, evitando fissuras, que normalmente encurtam a vida útil de uma via.

Ou seja, um asfalto de melhor qualidade poderia ser um modo de solucionar a questão dos buracos nas vias. E quanto à avenida construída sobre o rio e, ainda por cima, com erro técnico. O geógrafo Edson Pistori, que faz a crítica, também propõe uma solução: “tirar a tampa do córrego São Pedro e reurbanizar de outra forma as suas margens, considerando as chuvas no seu volume máximo e promovendo uma verdadeira integração com o meio ambiente e a circulação de pessoas e veículos”. 

Esse modelo já adotado em diversas cidades, além de resolver as constantes inundações, permite alterar a relação das pessoas com a cidade, com seu espaço e com sua natureza. Em Uberlândia, por enquanto, seguimos com vias esburacadas e a população sofrendo as consequências. Vem chuva, vai chuva, e os problemas permanecem. 

Laura Fontoura
laura.l.f@hotmail.com
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