
25 abr Um país desigual: a temática indígena na escola básica e suas consequências
É inegável a presença do racismo estrutural na nossa sociedade. No entanto, mudar essa realidade para que qualquer povo possa ter seus direitos respeitados é necessário. Nessa semana, temáticas indígenas foram levantadas em diversos países da américa latina em celebração ao Dia do Índio na última segunda-feira (19). Contudo, muitos não percebem a generalização padronizada que a sociedade faz do ser indígena ao seu imaginário, desprezando seus direitos, sua importância e também sua diversidade cultural.
O próprio termo “índio” remete à imagem descrita por colonizadores sobre os povos nativos do Brasil como selvagens, preguiçosos e atrasados. Essa caracterização é reproduzida até hoje, inclusive por figuras importantes como, por exemplo, o atual presidente, Jair Messias Bolsonaro, que em uma conversa com o Ministro da Infraestrutura no início de 2020, disse que ”Índio tá evoluindo, cada vez mais é ser humano igual a nós”. Essa fala potencializa a discriminação desses povos por não respeitar seu modo de vida e de trabalho, além de supor que o ser indigena está deixando a sua cultura somente por acessar elementos da nossa. Veja outras expressões muito utilizadas e que potencializam o racismo aqui.
Temática indígena nas escolas
Na escola básica, é muito comum os professores no dia 19 de abril, vestirem seus alunos com apetrechos das culturas dos povos indígenas a fim de celebrar o dia do índio. Esse tipo de “homenagem” acaba sendo mais problemática do que efetiva, por não reconhecer a existência desses povos e, sim, considerá-los uma “fantasia”. Mas, essa prática não é “culpa” dos professores da escola básica, afinal eles também tiveram essa educação, mas da narrativa utilizada pelos colonizadores presente nos livros de história.
Formada na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), a historiadora e professora, Tássita de Assis Moreira, compartilhou com a Conexões que essa narrativa descreve os povos indígenas como apenas um elemento da história ou como uma fantasia para exercer poder. “Os antropólogos achavam que os indígenas iam se extinguir por serem ‘selvagens’, porque eles não entendiam a lógica da vivência dos povos indígenas”, contou ela.
Logo, ao ver que essas pessoas não estão “desaparecendo”, passaram a mudar a forma de vê-los com uma narrativa generalista, que descreve esse povo como um grupo homogêneo, o que não prepara o ser para encontrar pessoas indígenas na realidade, pois ao vê-las querem que se comportem como aprenderam na escola. “Quando a gente aprende isso na escola, chega uma pessoa indígena na realidade dela, a gente quer que aquela pessoa seja aquilo que a gente aprendeu na escola, porque a escola é a nossa referência. […] E aí se você ensina uma criança que ela pode fazer um ‘cocar’ de cartolina e colocar na cabeça para fingir que é índio, porque índio é uma coisa que está no imaginário dela e não existe de verdade, ela vai tratar aquela pessoa de forma racista”, compartilhou a professora.
Acesso ao sistema educacional
O caminho para conseguir uma vaga em uma boa universidade não é nada fácil. Mas se o caminho já não é fácil, imagina para os grupos mais oprimidos da sociedade que foram marginalizados por mais de 500 anos. Os povos indígenas passaram, e ainda passam, por grandes dificuldades em acessar o sistema educacional brasileiro. A tragetória dessas pessoas é ainda mais dificil, pois acabam precisando se inserir em uma cultura muito diferente da delas, além de toda discriminação, como afirma a professora Tássita: “Se o caminho para uma pessoa branca é difícil, pra uma pessoa preta e uma pessoa indígena é 3, 5, 1000 vezes mais difícil, e o caminho quando eu digo, às vezes é um caminho literal mesmo. Sair da aldeia, pegar um carro, pegar um avião, chegar a uma universidade, muitas vezes bem longe do seu povo.”
Atualmente, temos escolas voltadas apenas para um sistema de educação indígena que procura transmitir conhecimento de forma a respeitar a diversidade cultural desses povos e as suas especificidades. Entretanto, em um contexto de pandemia, como o que estamos vivendo, podemos observar uma grande dificuldade do ensino regular em continuar com a reprodução das aulas. Logo, com o ensino indígena não poderia ser diferente. Além disso, segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a mortalidade da população indígena continua mais alta que a mortalidade geral no Brasil pela COVID-19.Entrar em uma universidade, acaba sendo para esses povos uma alternativa para lutar contra um governo que parece não vê-los. Em busca de políticas públicas que tornassem a universidade mais diversa, um sistema de cotas foi criado, inclusive na pós-graduação da UFU, de maneira provisória. No entanto, tais medidas precisam ser algo permanente para buscar mudanças nas situações que vivemos desde o século XV, “500 anos de história não se resolvem em 10”, afirma Tássita.
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